- Atas do VI Congresso Internacional de Ciências Jurídico-Empresariais: A Insolvência e as Empresas (abril de 2015), disponível aqui.
- Diapositivos "Insolvência e cessação
dos contratos de trabalho - O papel do Administrador de Insolvência", da Sociedade de Advogados GLX LTM, Associados (29.11.2019), disponível aqui.
- Algumas dissertações de mestrado acessíveis online, em acesso aberto (por ordem cronológica decrescente): aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.
- Alguns aspetos procedimentais na jurisprudência:
a) Acórdão do TRG, de 15/03/2016, processo n.º 814.14.4TJVNF-F.G1, relator Isabel Rocha:
Sumário:
I-O art.º 347 n.º 3 do Código do Trabalho aplicável nos casos de cessação do contrato de trabalho decorrente do encerramento do estabelecimento do estabelecimento definitivo em sede de insolvência rege que a cessação dos contratos de trabalho deve ser antecedida do procedimento previsto no art.º 360.º relativo ao despedimento colectivo com as necessárias adaptações.
II-Não obstante, não constando da letra da norma do art.º 347.º CT, qualquer referência à consequência no caso de incumprimento das formalidades, temos para nós que a mesma deve ser objecto de interpretação extensiva no sentido de se considerar a aplicação do regime do despedimento colectivo no que concerne às consequências da omissão dos procedimentos, uma vez que, a razão de ser de tais procedimentos com as devidas adaptações é a mesma, ou seja, a protecção dos trabalhadores designadamente no que concerne aos seus direitos no caso concreto os direitos de créditos, decorrentes da extinção do contrato de trabalho, concluindo-se que a letra da seu texto fica aquém do espirito da lei, pois que a fórmula verbal adoptada peca por defeito, por dizer menos do que aquilo que pretendia (art.º 9.º do CC). Ou seja, a razão da obrigação das formalidades está indubitavelmente abrangida no espirito da lei, razão pela qual nem sequer estamos em face de uma qualquer lacuna da lei.
III -A norma do art.º 388.º do CT não substantiva, não tem cabimento quando os trabalhadores exercem os seus direitos de créditos em sede de insolvência, uma vez que art.º 90.º do CIRE dispõe que os credores da insolvência apenas poderão exercer os seus direitos em conformidade com os preceitos do presente Código.
Da Fundamentação destaco ainda:
É certo que, alguns dos procedimentos não se adaptam á natureza da cessação do contrato de trabalho.
Assim sucede no que concerne à comunicação escrita referida no art.º 360.º n.ºs 1e 2 alínea a) não se justifica a referência aos motivos invocados pelo despedimento, mas ainda assim faz sentido a comunicação ainda que baste a indicação da situação de insolvência.
Também não faz sentido o disposto no n.º 2 alíneas b e c), do mesmo art.º relativo aos critérios de selecção dos trabalhadores a despedir uma vez que, o encerramento do estabelecimento afecta todos os trabalhadores.
Já alínea e) deve ser cumprida.
Quanto à alínea f) do mesmo art.º não parece que os administrador da insolvência possa ao abrigo do art.º 360 n.2 atribuir aos trabalhadores qualquer indemnização acima dos critérios legais uma vez que está que lhe está vedado agravar a situação financeira da empresa.
Por outro lado, entende-se que não parece haver lugar às informações e negociações previstas no artº 361º, porque elas pressupõem a continuidade da empresa.
Mas entendemos aplicável no caso concreto, o aviso prévio referido no art.º363.º 1 n.º 2 do CT.
No caso dos autos e ressalvando a conciliação entre o apelante e a Administradora da Insolvência, que se gorou, nenhuma formalidade foi cumprida que coubesse no caso concreto. Ora os procedimentos que cabem neste caso não são despicientes pois que, as formalidades exigidas no caso, na medida em que decorrem para a transparência dos actos e das suas motivações, permitem uma melhor definição e ponderação de interesses permitindo concretamente, a protecção do trabalhador no sentido de ter a informação necessária para aferir dos seus direitos decorrentes da cessão do contrato de trabalho no caso os direitos de créditos, e ainda a possibilidade de organizara a sua vida, antecipadamente, em face da extinção do seu contrato de trabalho.
Como refere o Conselheiro Júlio Gomes, “Parece-nos, que havendo caducidade dos contratos de trabalho por força do encerramento definitivo da empresa haverá que realizar o procedimento previsto para o despedimento colectivo, como inequivocamente resulta do n.º 5 do artigo 347.°, o qual, longe de ser inútil , esclarece que mesmo nesta hipótese há que respeitar o procedimento do despedimento colectivo com as necessárias adaptações não devem traduzir-se em suprimir o referido procedimento das formalidades.” (in Nótula sobre os efeitos da insolvência do empregador nas relações de trabalho).
Disponível aqui.
b) Acórdão do STJ, de 30/05/2017, processo n.º 1385/13.4TJCBR-H.C1.S1, relator José Rainho:
Sumário:
I - A cessação, no contexto da insolvência, do contrato de trabalho de trabalhador cuja colaboração não seja indispensável ao funcionamento da empresa, deve ser antecedida do pré-aviso a que se refere o nº 1 do art. 363º do Código do Trabalho, por força do nº 3 do art. 347º do mesmo Código.
II - Não tendo sido observado tal pré-aviso, haverá lugar na insolvência à consideração do crédito reclamado correspondente à retribuição inerente ao período do pré-aviso omitido.
Factos provados:
- A insolvência de AA, Lda. foi declarada em 7 de junho de 2013;
- O respetivo estabelecimento manteve-se em laboração com três trabalhadores (os indicados na alínea f) do dispositivo do acórdão recorrido);
- O encerramento ocorreu em 31 de julho de 2013;
- Por comunicação de 20 de junho de 2013 a administradora da insolvência fez cessar os contratos de trabalho dos demais trabalhadores impugnantes (ou seja, de todos os trabalhadores impugnantes para além dos três indicados) com efeitos imediatos;
- Tal comunicação não foi feita com a antecedência de 75 dias;
- Todos esses trabalhadores em causa possuíam antiguidade superior a 10 anos.
Destaco, ainda, na fundamentação:
Sustenta a Recorrente que, diversamente do decidido no acórdão recorrido, não gozam os credores trabalhadores em questão do direito à retribuição correspondente ao período de pré-aviso 75 dias. Entende que a norma (art. 363º, nº 1) do Código do Trabalho que, no contexto do despedimento coletivo, trata desta matéria não tem aplicação ao caso, antes terá o assunto que ser equacionado à luz das normas que cita do CIRE (Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas).
Cremos que não tem razão.
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Como reconhece a própria Recorrente nas suas conclusões D e E, o pré-aviso tem em vista assegurar interesses assaz relevantes para o trabalhador, e daqui que, mantendo-se o estabelecimento em funcionamento, parece começar por não fazer muito sentido admitir que a lei possa ter querido abduzir tal pré-aviso do leque das exigências procedimentais para que remete (as do despedimento coletivo). O que é dizer, as “necessárias adaptações” de que fala o nº 3 do art. 347º do Código do Trabalho não implicam o afastamento da referida exigência legal. Na realidade, a expressão “necessárias adaptações” só pode estar a reportar-se à supressão dos procedimentos cujo cumprimento não teria utilidade nenhuma nem faria qualquer sentido, e não vemos que seja o caso.
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A verdade é que, e contrariamente ao entendimento da Recorrente, não estando ainda o estabelecimento definitivamente encerrado (com o que se mantêm os contratos de trabalho e está o administrador da insolvência obrigado a satisfazer integralmente as obrigações para com os trabalhadores) nem estando comprovadamente decidido ou deliberado o seu encerramento para o imediato, nada se encontra à partida que contenda quer com a operacionalidade quer com a lógica do pré-aviso para a cessação do contrato de trabalho no contexto em que nos movemos, na certeza até de que o estabelecimento poderá nem sequer vir a ser encerrado (v., entre outros, os art.s 1º, nº 1, 55º, nº 1 b), 156º, nº 2, 162º, 192º, nº 1 e 195º, nº 2 b) do CIRE). E se, ao invés, estiver já decidido ou deliberado para breve o encerramento do estabelecimento, e assim traçado o destino dos contratos de trabalho (caducidade), certamente que não se antolhará como necessária (nem tal se esperará de um administrador da insolvência diligente, isto com vista a evitar sobrecarregar a massa com a retribuição inerente ao período do aviso prévio) a cessação de contratos de trabalho de trabalhadores cuja colaboração não seja indispensável ao funcionamento da empresa.
Aplicando este entendimento ao caso concreto, pensamos, assim, que havia de ter sido cumprido o pré-aviso legal, pois que, à partida, nada o impedia em termos operacionais e lógicos. Repare-se, a propósito, que nada se mostra sequer alegado ou provado no sentido de que aquando da cessação dos contratos de trabalho existia deliberação ou decisão no sentido do encerramento do estabelecimento (e muito menos encerramento para breve), conquanto se saiba que este foi encerrado pouco mais de um mês depois. E, por outro lado e como se aponta no acórdão recorrido, a extinção dos contratos de trabalho não pode ocorrer de forma abrupta, antes terá que acontecer, sendo tal possível, de modo a permitir a tomada de medidas que possam minorar os graves danos que resultam para os trabalhadores da perda do seu emprego. O período de pré-aviso concede ao trabalhador um tempo para se reorganizar do ponto de vista laboral, de modo que a cessação do contrato só deverá poder ocorrer após o decurso desse prazo ou, se for o caso, com o encerramento definitivo do estabelecimento. Nenhuma norma, princípio ou orientação constante do CIRE contraria, quanto a nós, esta conclusão.
Donde, inobservado que foi in casu o pré-aviso devido, ocorreu um ilícito contratual, gerador da obrigação de reparação do dano na forma específica fixada na lei. O que é dizer, haverá lugar na insolvência à consideração dos reclamados créditos correspondentes à retribuição inerente ao período do pré-aviso omitido (75 dias, conforme a alínea d) do nº 1 do art. 363º do Código do Trabalho). (No limite, poder-se-ia porventura defender que deveria haver lugar ao pagamento de apenas parte desse tempo de retribuição. Dir-se-ia: tendo ocorrido o encerramento definitivo do estabelecimento - momento em que sempre caducariam os contratos de trabalho - antes de transcorrido o referido período do aviso prévio, cessaria necessariamente nessa altura o dano que a lei visa ser reparado, de sorte que os trabalhadores apenas teriam direito às retribuições que iriam auferir até à virtual caducidade do contrato. A verdade, porém, é que este possível enquadramento jurídico não faz parte do thema decidendum tal como proposto no presente recurso, pelo que não nos vamos envolver nele).
Por último: embora o panorama jurisprudencial e doutrinário não forneça (tanto quanto seja do nosso conhecimento) qualquer contributo acerca da concreta questão aqui em discussão, aponte-se ao menos o contributo académico de Leonor Pizarro Monteiro (O Trabalhador e a Insolvência da Entidade Empregadora, Almedina, 2017, p. 45, nota 53 [dissertação de mestrado]), que vai precisamente no sentido que defendemos: que na cessação do contrato no contexto do nº 2 do art. 347º do Código do Trabalho deverá ser cumprido o aviso prévio previsto no nº 1 do art. 363º do Código do Trabalho, não podendo o trabalhador ser confrontado com a rotura abrupta da relação laboral. Esta parece constituir, na verdade e dentro do enquadramento acima exposto, a boa interpretação da lei.
Disponível aqui.
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