Pergunta:
Quando a parte requer, logo no seu articulado inicial, a prestação de “declarações de parte” indicando os respectivos factos, preclude o direito de ampliar o âmbito factual de tais declarações, até ao início das alegações orais em 1.ª instância?
Resposta:
Com todo o respeito, a resposta só pode ser uma: não.
Na verdade, não só o regime da “Prova por declarações de parte” não estabelece norma igual à da “Prova por confissão das partes” - o artigo 452.º, n.º 2 do CPC -, como a lei processual também não determina, explicita ou implicitamente, a preclusão do direito de ampliar o âmbito factual das “declarações de parte”, até ao início das alegações orais em 1.ª instância, caso a parte tenha indicado, parcialmente, os respectivos factos logo no articulado inicial.
Assim, o legislador não só determinou momentos processuais diferentes para a indicação dos factos sobre os quais hão-de cair o “depoimento de parte” e as “declarações de parte”, como lhe atribui diferente valor probatório, como decorre do n.º 3 do citado artigo 466.º do CPC:
“3 - O tribunal aprecia livremente as declarações das partes, salvo se as mesmas constituírem confissão”.
[cf., sobre o valor probatório da confissão, o artigo 358.º do C. Civil].
Assim, atenta uma das regras base de interpretação da lei, contidas no artigo 9.º do C. Civil, não pode, não deve, o intérprete tratar por igual o que o legislador expressou desigual: artigo 452.º, n.º 2, versus, artigo 466.º, n.º 1, ambos do CPC.
Por outro lado, sendo as “declarações das partes” de livre apreciação pelo tribunal, o processo de formação da convicção judicial não deve ignorar o princípio da verdade material.
O princípio da verdade material tem subjacente o princípio do inquisitório, introduzido no direito processual civil pelo artigo 411.º do novo CPC, já existente no direito processual laboral, pelo menos, desde o CPT de 1981. Caracteriza-se, na sua essência, pelo princípio da prevalência do mérito sobre meras questões de forma e conjuga-se com o previsto reforço dos poderes de direcção, agilização, adequação e gestão processual do juiz, no sentido de que toda a actividade processual deve ser orientada para propiciar a obtenção de decisões que privilegiem o mérito ou a substância sobre a forma – cf. artigo 6.º do CPC.
E se tal princípio deve ser respeitado em todas as áreas do direito civil, por maioria de razão o deve ser na área do direito do trabalho, por força do poder-dever imposto ao juiz, pelo legislador, no artigo 72.º do CPT.
Em conclusão: caso a parte tenha apresentado no articulado inicial, requerimento de declarações de parte com a discriminação dos factos sobre que hão-de recair, não preclude o direito de ampliar o âmbito factual de tais declarações, até ao início das alegações orais em 1.ª instância, sobre factos em que tenha intervindo pessoalmente ou de que tenha conhecimento directo, independentemente, do momento temporal da intervenção ou do conhecimento.
(Ac. do TRP, de 15/12/2021, processo n.º 3675/20.0T8VNG.P1, relator Domingos Morais, disponível aqui).
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